Entenda o princípio da dialeticidade e como ele garante o contraditório em processos judiciais. Simplificamos esse conceito para você!
Índice
ToggleA importância dos recursos
O recurso é um instrumento essencial no processo judicial, pois permite a revisão de decisões que possam conter erros ou injustiças; ele assegura o contraditório e a ampla defesa, proporcionando às partes a oportunidade de contestar interpretações jurídicas ou a avaliação dos fatos feita pela instância originária.
Os recursos promovem a uniformidade da jurisprudência, contribuindo para a consolidação de entendimentos nos tribunais; e cooperam para a evolução da jurisprudência, possibilitando que entendimentos ultrapassados sejam revistos e adaptados para a nova realidade social.
Assim, o sistema recursal é indispensável para a realização de uma justiça eficaz e equitativa.
Elementos do recurso. Relação com o princípio da dialeticidade

Todo recurso apresenta dois elementos essenciais:
- O elemento volitivo, relativo à vontade da parte de recorrer.
- O elemento descritivo, relativo aos fundamentos e pedidos do recurso.
O princípio da dialeticidade está relacionado ao elemento descritivo do recurso.
A dialeticidade como garantia do contraditório
O princípio da dialeticidade dos recursos é previsto no artigo 1.010 do Código de Processo Civil (CPC) e constitui-se em manifestação do princípio do Estado de Direito. Está amparado no princípio do contraditório, que é um direito fundamental dos litigantes (art. 5º, LV, da CF/88).
A parte recorrente deve fundamentar seu inconformismo com a decisão e apontar os capítulos que pretende reformar; isso garante a observância do contraditório e permite a apresentação de contrarrazões no processo do trabalho.
A dialeticidade e a fundamentação remissiva
Parte da doutrina defende que o recorrente pode apenas reproduzir os fundamentos da petição inicial, desde que estejam relacionados à decisão impugnada e permitam que o Juízo e a parte contrária identifiquem claramente qual é a irresignação do recorrente (Daniel Amorim Assumpção Neves – Manual de Direito Processual Civil – 2017).
Isso porque, o princípio da eventualidade impede a inovação em matéria jurídica na fase recursal, de modo que o recorrente pode apresentar fundamentação remissiva se a discussão for somente de direito, ao invés de “copiar e colar” a tese da petição inicial.
Por outro lado, a impugnação deve necessariamente atacar a valoração probatória quando a questão envolve matéria fática, não sendo possível a fundamentação remissiva.
A dialeticidade e o trânsito em julgado

A fundamentação do recurso com indicação dos capítulos que o recorrente pretende reformar possibilita conhecer quais capítulos da sentença transitaram em julgado.
Isso é importante, pois o trânsito em julgado autoriza a execução definitiva e não apenas provisória dos capítulos não impugnados.
A dialeticidade e o efeito devolutivo em profundidade
O princípio da dialeticidade dos recursos também dialoga com o efeito devolutivo do recurso, em profundidade, assegurando que o Tribunal possa revisar tanto os pontos expressamente impugnados, como questões conexas que sejam relevantes para a solução do conflito.
Dialeticidade e princípio da primazia do julgamento do mérito
A fundamentação exigida pelo princípio da dialeticidade contribui para a concretização do princípio da primazia do julgamento de mérito, evitando que os recursos não sejam conhecidos.
Artigo 899, da CLT. Necessidade de fundamentar o recurso
O art. 899, da CLT, prescreve que os recursos serão interpostos por simples petição, o que levou parte da doutrina e da jurisprudência a concluir que no processo do trabalho não haveria necessidade de fundamentação para recorrer.
Mauro Schiavi era um dos que defendiam a possibilidade de interposição de recurso desacompanhado de razões.
No entanto, o autor mudou de opinião, passando a entender que
o recurso por simples petição, desacompanhado de razões, somente pode ser aplicável ao Processo do Trabalho, nos recursos de fundamentação livre, a exemplo do recurso ordinário, e se o recorrente estiver sem advogado, valendo-se do jus postulandi (Manual de Direito Processual do Trabalho – 2015).
Críticas à interpretação literal do art. 899, da CLT
Conheça os tipos de interpretação do Direito do Trabalho
Carlos Henrique Bezerra Leite critica a interpretação literal do artigo 899, da CLT, afirmando que a interposição de recurso desacompanhado das razões equipara-se à contestação por negação geral e à petição inicial que não apresenta a breve exposição dos fatos, tornando inviável o exercício da ampla defesa pela parte contrária.
Para o mencionado autor,
O jus postulandi e o princípio da simplicidade, que são infraconstitucionais, não podem olvidar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (Curso de Direito Processual do Trabalho – 2017).
Nosso entendimento sobre o art. 899, da CLT
Em nossa opinião, o art. 899, da CLT, indica apenas a forma ao dispor que os recursos serão interpostos por simples petição, não eximindo o interessado de expor os motivos da apresentação do recurso.
Portanto, entendemos que a lei não dispensa a fundamentação do recurso.
Princípio da dialeticidade e Súmula 422 do TST
As razões do recurso devem ser dialéticas, guardando simetria com a decisão atacada, conforme dispõe a Súmula 422 do TST.
A parte recorrente deve apresentar os fundamentos pelos quais entende que a decisão de origem contém erro de julgamento ou de procedimento processual. E deve manifestar pedido de reforma, integração, esclarecimento ou anulação da decisão impugnada.
Conclusão
Em conclusão, o princípio da dialeticidade dos recursos reafirma a necessidade de fundamentação clara e objetiva dos apelos interpostos no processo judicial.
Esse princípio, intimamente ligado ao contraditório e à ampla defesa, assegura que as partes tenham a oportunidade de expor seus argumentos de maneira estruturada, permitindo a análise efetiva pelos tribunais e a apresentação de contrarrazões pela parte adversa.
No processo do trabalho, mesmo diante da simplicidade formal prevista no artigo 899 da CLT, prevalece a necessidade de fundamentação para garantir o equilíbrio entre a simplicidade processual e os princípios constitucionais.
Assim, o respeito ao princípio da dialeticidade é essencial para a legitimidade e a eficácia do sistema recursal, contribuindo para uma justiça mais acessível e democrática.