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Direito Laboral

Entendimentos vinculantes do TST sobre dano moral

Introdução

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) consolidou precedentes que vinculam toda a Justiça do Trabalho. Esses temas definem quando o dano moral se presume (in re ipsa) e quando exige prova específica, oferecendo segurança jurídica e uniformizando decisões.

Dano moral presumido (in re ipsa)

Tema 1 – Certidão de antecedentes criminais

Teses:

  1. Não é legítima e caracteriza lesão moral a exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego quando traduzir tratamento discriminatório ou não se justificar em razão de previsão em lei, da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido;
  2. A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego é legítima e não caracteriza lesão moral quando amparada em expressa previsão legal ou justificar-se em razão da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido, a exemplo de empregados domésticos, cuidadores de menores, idosos ou deficientes (em creches, asilos ou instituições afins), motoristas rodoviários de carga, empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes, bancários e afins, trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes e armas, trabalhadores que atuam com informações sigilosas;
  3. A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais, quando ausente alguma das justificativas supra, caracteriza dano moral in re ipsa, passível de indenização, independentemente de o candidato ao emprego ter ou não sido admitido.

Comentário:

A ratio decidendi ancora-se na dignidade humana (art. 1º III, da CF/88) e na vedação à discriminação (arts. 3º IV e 5º XLI, da CF/88).

Exigir certidão sem lastro legal viola a igualdade e a liberdade profissional (art. 5º XIII, da CF/88).

O precedente está em harmonia com a Convenção 111 da OIT, que proíbe discriminação em emprego.

No entanto, quando há previsão legal ou fidúcia especial, a medida é proporcional; fora dessas hipóteses, o dano moral é presumido, pois o candidato sofre estigmatização automática.

Tema 54 – Falta de sanitários e local de refeição

trabalhadores varrendo a rua

Tese:

A ausência de instalações sanitárias adequadas e de local apropriado para alimentação a empregados que exercem atividades externas de limpeza e conservação de áreas públicas autoriza a condenação do empregador ao pagamento de indenização por danos morais, pois desrespeitados os padrões mínimos de higiene e segurança do trabalho, necessários e exigíveis ao ambiente de trabalho (NR-24 do MTE, CLT, art. 157, Lei 8.213/91, art. 19, e CRFB, art. 7º, XXII).

Comentário:

O TST reconhece afronta direta ao direito fundamental à saúde e ao ambiente de trabalho digno (art. 6º, da CF/88).

A ausência de instalações sanitárias adequadas e de local apropriado para alimentação contraria a NR-24 e o art. 157 da CLT, configurando ilicitude flagrante.

A violação a normas de ordem pública faz presumir o abalo à integridade física e moral do empregado.

Tema 61 – Transporte de valores por empregado não especializado

Tese:

O transporte de valores por trabalhador não especializado configura situação de risco a ensejar reparação civil por dano moral in re ipsa, independentemente da atividade econômica do empregador.

Comentário:

Ao desviar empregado comum não especializado em segurança para tarefa de alto risco, o empregador fere o direito fundamental à segurança (arts. 5º caput, CF/88).

A circunstância configura ato ilícito a justificar a reparação por danos morais, sem necessidade de prova do abalo psicológico sofrido.

Comprovada a realização do transporte de valores em condições inseguras e sem o devido treinamento específico fornecido ao empregado, presume-se a ocorrência de abalo emocional, em razão da tensão psicológica naturalmente associada a essa atividade.

O dano, portanto, decorre da exposição involuntária a risco excepcional.

Tema 62 – Dispensa por justa causa (ato de improbidade) revertida

Tese:

A reversão da dispensa por justa causa baseada em alegação de ato de improbidade (CLT, art. 482, “a”) que se revela judicialmente infundada ou não comprovada enseja reparação civil, in re ipsa, por dano moral.

Comentário:

A dispensa por justa causa possui natureza sancionatória e os motivos que a justificam devem ser robustamente comprovados pelo empregador, detentor do ônus da prova.

A invalidação da justa causa em Juízo indica abuso do poder disciplinar; a acusação infundada de improbidade atinge honra objetiva e subjetiva (arts. 5º V e X, da CF/88).

O dano moral é presumido, dada a estigmatização social e os reflexos profissionais da imputação injusta.

Tema 84 – Roubo sofrido por carteiro

Tese:

Em caso de roubo sofrido por carteiro (agente postal) durante o trabalho, é objetiva a responsabilidade civil do empregador pela reparação do dano moral, uma vez que a atividade de entrega de correspondências e mercadorias envolve risco diferenciado em relação aos trabalhadores em geral.

Comentário:

A atividade de entrega postal envolve, por sua própria natureza, risco acentuado que atrai a responsabilidade objetiva do empregador, nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código Civil.

Pela teoria do risco-proveito, aquele que aufere benefícios econômicos da atividade assume o dever de reparar os danos dela decorrentes, independentemente da demonstração de culpa.

Nessa perspectiva, o trauma resultante de assalto durante o desempenho da função presume violação aos direitos da personalidade do trabalhador, ensejando o dever de indenizar.

Por fim, o precedente trata especificamente do dano moral. Eventual dano material decorrente do assalto (pertences pessoais subtraídos) deve ser analisado caso a caso.

Tema 88 – Impedimento de retorno ao trabalho após alta previdenciária

Tese:

A conduta do empregador, ao impedir o retorno do empregado ao trabalho e inviabilizar o percebimento da sua remuneração após a alta previdenciária, mostra-se ilícita e configura dano moral in re ipsa, sendo devida a indenização respectiva.

Comentário:

A conduta do empregador que se recusa a reintegrar o empregado após a cessação do benefício previdenciário afronta não apenas os direitos sociais consagrados nos arts. 6º e 7º da Constituição Federal, mas também viola a sistemática jurídica estabelecida pelos arts. 476 da CLT e 63 da Lei nº 8.213/91.

Esses dispositivos determinam que a suspensão do contrato de trabalho limita-se ao período de percepção do auxílio-doença, impondo ao empregador o dever de reintegração e de retomada do pagamento dos salários tão logo o benefício seja cessado por alta médica.

A resistência patronal em cumprir essa obrigação legal dá origem ao chamado limbo jurídico-previdenciário, situação em que o trabalhador, embora apto ao trabalho segundo a Previdência Social, encontra-se desamparado tanto pela empresa quanto pelo INSS.

Tal omissão viola o princípio da boa-fé objetiva e configura ato ilícito, nos termos dos arts. 186 e 187 do Código Civil.

Nessa hipótese, o nexo entre a conduta omissiva da empresa e o dano é direto e evidente: ao ultrapassar de forma abusiva os limites do seu poder diretivo, a empregadora compromete a dignidade e a subsistência do empregado, ensejando a responsabilização civil prevista no art. 927 do Código Civil.

Diante dessa ilicitude qualificada, a jurisprudência do TST reconhece o dano moral in re ipsa, afastando a necessidade de prova específica do abalo psíquico.

Tema 181 – Dano moral em ricochete

Tese:

É devida indenização por dano moral em ricochete (indireto ou reflexo), por presunção relativa, aos integrantes do núcleo familiar (filhos, genitores, irmãos e cônjuge ou companheiro) de empregado que é vítima fatal de acidente de trabalho.

Comentário:

O art. 948, II, do CC prevê indenização à família do falecido. O TST presume o sofrimento psíquico dos familiares, dispensando prova individual.

A decisão concretiza a proteção à família (art. 226, da CF/88) e à dignidade humana, buscando amenizar o desequilíbrio afetivo causado pelo falecimento do empregado.

Tema 192 – Retenção injustificada da CTPS

Tese:

A retenção injustificada da CTPS por tempo superior ao fixado na lei configura ato ilícito ensejador de dano moral por presunção.

Comentário:

A conduta viola o art. 29 da CLT e a liberdade profissional (art. 5º XIII, da CF/88); ao reter a CTPS do empregado por prazo superior ao fixado em lei, o empregador impede a obtenção de novo emprego e benefícios, atingindo a reputação e a autonomia do trabalhador.

O dano decorre do próprio ilícito, presumindo-se o abalo moral.

Hipóteses que exigem prova concreta de lesão

Tema 58 – Revista visual impessoal

revista impessoal

Tese:

A realização de revista meramente visual nos pertences dos empregados, desde que procedida de forma impessoal, geral, sem contato físico e exposição dos trabalhadores a situação humilhante ou vexatória, não configura ato ilícito apto a gerar indenização por dano moral.

Comentário:

A jurisprudência do TST distingue a “revista íntima”, que implica contato físico ou exposição da intimidade (prática vexatória vedada por violar a dignidade humana) da “revista meramente visual”, realizada de forma geral, impessoal e sem toque.

Nesta última hipótese, o procedimento se enquadra no poder diretivo e fiscalizador do empregador (art. 2º, CLT) e observa o princípio da proporcionalidade, pois visa proteger o patrimônio da empresa sem afrontar, em regra, os direitos da personalidade do empregado.

Assim, quando a inspeção é limitada a bolsas ou sacolas, sem exposição do corpo ou constrangimento individual, o ato não constitui ilícito nem gera dano moral in re ipsa.

O empregado somente fará jus à indenização se demonstrar excesso: contato físico, seleção discriminatória, humilhação pública ou violação concreta da privacidade, casos em que o constrangimento se equipara à revista íntima e ofende diretamente a dignidade constitucionalmente assegurada.

Tema 60 – Ausência de registro na CTPS

Tese:

A ausência de anotação do vínculo de emprego na Carteira de Trabalho não caracteriza dano moral in re ipsa, sendo necessária a comprovação de constrangimento ou prejuízo sofrido pelo trabalhador em seu patrimônio imaterial para ensejar a reparação civil, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil.

Comentário:

A infração gera multa administrativa (art. 47, da CLT), mas não presume abalo moral. O TST exige prova de repercussões concretas (como negativa de crédito e recusa de benefício previdenciário) para caracterizar dano extrapatrimonial.

Tema 143 – Atraso nas verbas rescisórias

Tese:

A ausência ou o atraso na quitação das verbas rescisórias, por si só, não configura dano moral indenizável, sendo necessária a comprovação de lesão concreta aos direitos de personalidade do trabalhador.

Comentário:

O atraso viola o art. 477 § 6º da CLT e enseja multa, mas o TST afasta a automática reparação moral.

Exige-se demonstração de prejuízo extrapatrimonial relevante, como inclusão em cadastros de inadimplentes ou privação de necessidades básicas, para satisfazer o binômio ilicitude-dano (art. 927, do CC).

Matérias afetadas com tese ainda não firmada

Ultima atualização em 13/07/2025

Tema 34: Configura dano moral in re ipsa a aferição de tempo utilizado para ir ao banheiro como medida para cálculo de parcela variável da remuneração?

Tema 103: O atraso reiterado e injustificado no pagamento de salários pelo empregador configura hipótese de dano moral ao empregado sujeito à reparação?

Tema 107: A exposição do empregado em trajes íntimos, em vestiário coletivo, para cumprimento de procedimento de higienização denominado “barreira sanitária”, previsto em norma técnica do Ministério da Agricultura para as empresas do ramo alimentício, por si só, acarreta dano moral?

Tema 117: 1 – É ilícito o controle ou a limitação, pelo empregador, ao uso do banheiro durante a jornada de trabalho do empregado? 2 – O controle ao uso do banheiro, pelo empregador, durante a jornada de trabalho, configura dano moral in re ipsa? 3 – A hipótese em que há prestação de serviços em linha de produção, com necessidade de substituição prévia do empregado no posto de trabalho, configura distinção?

Conclusão

Os entendimentos vinculantes do TST formam um mapa seguro para distinguir, no campo do dano moral, três situações centrais:

  1. Ilicitude grave ou risco anormal – casos em que o próprio fato ofensivo revela desrespeito direto à dignidade, dispensando qualquer demonstração adicional de abalo;
  2. Ilicitude sem risco acentuado – hipóteses em que, apesar da irregularidade, o trabalhador precisa comprovar dano extrapatrimonial concreto;
  3. Conduta lícita fiscalizatória – situações em que o poder diretivo é exercido de modo proporcional e impessoal, afastando, em regra, o dever de indenizar.

Ao sintetizar a Constituição (arts. 1º III, 5º, 6º e 7º), o Código Civil (arts. 186, 187 e 927) e a CLT, esses precedentes reforçam dois eixos fundamentais do direito do trabalho: a primazia da dignidade humana e a segurança jurídica.

Para o advogado, conhecer os temas vinculantes permite estruturar petições e defesas com maior precisão, selecionando adequadamente a prova quando necessária.

Para o empregador, os precedentes oferecem parâmetros objetivos de conformidade, orientando políticas internas que previnam o “limbo previdenciário”, o abuso disciplinar ou práticas seletivas discriminatórias.

Em síntese, a jurisprudência vinculante do TST não só equaliza o tratamento de casos semelhantes, mas também induz condutas empresariais responsáveis, garantindo que o contrato de trabalho permaneça um instrumento de promoção (e nunca de violação) da dignidade do trabalhador.